sábado, dezembro 09, 2006

Cigarras II

Há uma passagem no livro de Provérbios que diz: “vai ter com a formiga, ó preguiçoso..”. Concordo. Temo, porém, que a formiga que o preguiçoso encontre seja a nossa mesma formiguinha da história que já contamos. Certamente, não seria um exemplo a ser seguido. Ademais, numa sociedade de formigas como a nossa, esse conselho seria sem utilidade. Não seria preciso “ir”. Creio por isso, que era de outra formiga que o sábio conselheiro se referia.

Enquanto escrevia o texto “cigarras” o fiz afim de evidenciar o nosso tão reprimido lado cigarra. Tratei da nossa condição de “Alma de cigarra num como de formiga”, e do arquétipo que, aos poucos, a cigarra foi ganhando: um anseio pertencente a todos nós, um anseio que não se cala. Uma vontade irrefreável de cantar.

Por outro lado, evidenciou-se por si só uma outra condição nossa, essa talvez a que melhor nos represente: “Alma de formiga num corpo de cigarra”. Não, não somos formigas. Somos cigarras adormecidas como aquela águia que cresceu achando que era galinha da belíssima história que virou livro nas idéias do Leonardo Boff.

Como os mesmos fins libertadores, escrevo que somos cigarras criadas como formigas.

Espero que, ao se deparar com algum instrumento musical, ou até quem sabe ao ouvir os sons da saudade, como aquela águia, que se libertou ao contemplar o horizonte, a nossa verdadeira identidade nos seja revelada.

Na dedicatória do seu livro Boff refere-se a “águia mais aprisionada e reprimida de nossa cultura”, aos “ portadores da ânsia de ser-águia” e por fim o dedica a todos os que, sendo águias, são impedidos de o ser e se vêem reduzidos à condição de galinhas. Troque a palavra “águia” por cigarra, e terá a minha dedicatória.

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